Daí vem a palavra cosméticos.
Toda a filosofia estóica utilizava-se da razão, pois a razão conhece o que é racional pela identidade e pela identificação das naturezas, para conhecer a totalidade harmoniosa do concerto universal cheio de uma razão de ser. Talvez a dissecação de primeira vista mostrasse só confusão. Semelhante a quando estudamos um assunto pela primeira vez, informações difíceis, necessitando revisão. Mas a análise meticulosa e a busca incessante faziam com que se enxergasse esse todo belo, esse todo justo, esse todo cósmico, além das aparentes feiúras, injustiças, por trás do aparente caos.
Eu disse belo e volto a lembrar dos cosméticos.
Mas é possível encontrar uma falha nesse sistema de pensar. É uma falha que vem de um certo vício de pensamento. O amor pela ordem, pelo belo, pelo justo, pela harmonia era tão grande que nada impede que o sistema de pensamento criado para explicar o mundo e deixar essa harmonia visível, compreensível fosse um sistema viciado. Para os olhos de quem ama o belo, tudo ele quer que seja belo, em tudo quer ele encontrar o belo, e quem sabe ele não entre numa paixão, maquiada de razão, que venha a encontrar o belo onde não exista de fato.
Maquiada, eu disse. Volto a cosmética.
É o que a cosmética faz. Ressaltar a beleza de um rosto? Esconder as espinhas e os cravos, as manchas e certas dissimetrias!
O palhaço revoluciona nesse aspecto. Porque nós utilizamos uma maquiagem no sentido contrário do cosmético. Não, não é contrário. Mas diferente. E quero que vocês percebam que é o mesmo fim.
É da nossa filosofia ressaltar o que há de ridículo no mundo e em nós. Nossa maquiagem tem de ressaltar o que nos é defeituoso e, por isso mesmo, engraçado. Nossas roupas e nosso jeito também. Mas cultivamos uma arte que pretende fazer isso de forma bela. Contraditória por si mesma. Ressaltar, ampliar, exagerar o feio da forma mais bela que possamos fazer, para, no caso Y, chegar também ao belo. Porque não há nada mais belo do que relativizar o feio do hospital para fazer curar o sorriso de uma criança.
Então, na verdade, acho que a cosmética é uma corrupção do ideal estóico. O Y tem mais a ver com esse ideal. Porque a nossa cosmética trabalha exatamente com o feio, mas que dentro de um contexto maior, torna-se harmonicamente belo. Não disfarçamos nossas verrugas, as transformamos em graça, nos expomos e enfrentamos o riso debochado de todos os outros. Miramos aquele sorriso pequeno que nos enche de um êxtase, um momento de graça. Eternizamos aquele presente da visita.
Mexemos com o Amor.
Allan Denizard
Um comentário:
Tô sentindo falta dos relatos de vcs...
Cadê vcs?
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