quarta-feira, 11 de março de 2015

Palhaço, Sorriso e Instante como Terapia [de existir]




Referências da Palestra dada originalmente ao dia 09 de março de 2015 como parte do Curso "O cuidado à Criança: uma abordagem interdisciplinar humanizada".

Primeiro momento: Sobre o palhaço, a finitude, a fragilidade e a deformidade humana essencial. Sobre a contigência da nossa existência primordial à lei que nos ordena. Sobre uma visão não-fantástica do homem: o menino vadio, passível de se perder, fraco e tolo.

Para essa reflexão me vali da Música de Chico Buarque "Sem Fantasia" e a análise da mitologia grega de Ilíada e Odisséia, frisando a figura de Ulisses, o símbolo do grande Herói, mas cuja travessia de volta para seu reinado é marcado pelas humilhações que vai sofrendo e as ilusões a que vai sendo submetido até o ponto de atingir a lucidez de querer ser quem realmente é: o rei de Ítaca, possuidor do leito de Penélope. Embora Ulisses seja o símbolo do grande herói, minha tese aponta que foi no momento em que se reconheceu como simples mortal que se aproximou da simpatia dos deuses. Essa tese não foi aprofundada a contento e explicitamente porque dei mais vazão aos recursos cômicos que empreendi com a platéia, mas ei-la aqui exposta. Sobre essa tese, não é originalmente minha, mas um diálogo com reflexões de Luc Ferry que a expõe em vários momentos de sua obra, particularmente em "Aprender a Viver 2: a sabedoria dos mitos gregos".

Segundo momento: Sobre o sorriso, que é um sub-riso, portanto, sobre o riso, o quanto ele nos define (o único animal que ri, dizia Aristóteles), o quanto ele nos expõe (Hobbes), o quanto ele nos humilha (Platão), o quanto nos afasta da verdade pura (ainda Platão), o quanto ele nos diferencia de Deus e dos outros animais (ideia Medieval), MAS TAMBÉM o quanto ele nos devolve à humanidade, nos tira o peso da perfeição, nos ajuda a palpar as próprias feridas e fragilidades com leveza, fazendo-nos participar de uma alegria compartilhada quando nos entregamos ao ofício de palhaço, ao sublime de um amor que não nos quer forte para se preencher, mas nos quer como nós somos para nos amar por amar, sem porquês.

Para essa reflexão me vali largamente das análise de Verena Alberti em "O riso e o risível na História do Pensamento ocidental". Mas também de Ariano Suassuna em "Iniciação à Estética".

Terceiro momento: Sobre o instante como outra forma de pensar o tempo, um tempo dilatado, um tempo que dura, um tempo de delicadeza, um tempo de emoções, um tempo não-escatológico, não-apocalíptico, não portador de flecha de sentido, mas buscador da riqueza de sentidos presentes, buscador de gozos mais do que de chegar ao gozo, de intensidades mais do que de produtividade, de qualidade mais do que de quantidade.


Esqueci de fechar um círculo de reflexão aqui. Voltando a mitologia da Odisséia, quando Ulisses reencontra Penélope, depois de ter derrotado "os pretendentes" com a ajuda da deusa Atenas e do seu filho Telêmaco, quando enfim está no leito com sua rainha, Zeus faz com que o instante se estenda para que o casal viva intensamente o gozo daquele reencontro.

Para essa reflexão do instante me vali das análises sobre as Epistemologias do Sul de Boaventura de Sousa Santos, particularmente o que pode ser encontrado a respeito das monoculturas e ecologias do tempo no "Manual de Uso do Fórum Social Mundial". Também, uma referência ligeira à algo do pensamento Chinês presente na fala de François Jullien no CD Le Bonheur - Visions Occidentale Et Chinoise.


Querendo finalizar com poesia e algo do que vivi, fiz uma leitura dramática de "Velhas árvores" de Olavo Bilac, poema que marcou um momento de crise meu. A finitude e o ridículo do palhaço, o sorriso (mas também a lágrima) que tive (e quis despertar) e a importância do instante se aglutinam nesse poema - entenderão porque quando compartilhar o vídeo da declamação.


No momento anexo de perguntas me vali das reflexões de Edgar Morin e seu Pensamento Complexo ("Ciência com Consciência" e "Introdução ao Pensamento complexo"), da autoridade de Nise da Silveira e sua paixão por Espinosa em seu "Cartas à Spinosa", bem como das referências superficiais à "Ética segundo o método dos geômetras" de Spinoza, enriquecidos pelos comentários que venho ouvindo do filósofo Luc Ferry (Descartes - Spinoza - Leibniz l'Oeuvre Philosophique) e do desenvolvimento e atualização da teoria de Spinoza para nossos contextos contemporâneos de sentimento e razão feitos pelo filósofo André Comte-Sponville, em várias de suas obras.



Allan Denizard (Dr. Acerola)

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