terça-feira, 21 de abril de 2015

VER OUVINDO

VER OUVINDO.

Me inspirei com esse texto Cajuína, do Caju (aquele que é “antiético” por não ter a companhia de uma Castanha em vida, e sequer ter a Castanha no nome – indignação que partiu de uma enfermeira).

Eu, com Teteu no nome depois de um Chico, lembrei de um momento bonito hoje na pediatria. Eu e Caju. A gente já tava perto de ir embora, já com aquelas falas de despedida. Foi quando passando pelo quarto das meninas a gente viu a "K" esperneando na cama e sendo puxada pela mãe pra que ela saísse da cama. K tava virada com a cara no colchão, em um NÃO totalmente explícito de que não queria sair dalí.

Eu e Caju na porta. Vendo aquilo ali, eu pensei, pensei, e comecei a fazer algo. Olhei pra ele e comecei. “Levanta daí seu Caju! Tira essa cara do colchão!”.

E ele: não! não! Não quero não!

Eu: por que tu não quer?

Ele: porque não! quero ficar aqui.

Depois disso a mãe já parou de insistir K de sair da cama e ficou rindo olhando pra gente na porta sendo besta – que nem ela tava sendo. K continuou na sua posição quase que dentro do colchão, mas tranquila. Parou de espernear e pareceu calma. Tava vendo tudo ouvindo.

Eu e Caju continuamos. Falava que ele tinha que sair só pra almoçar, depois podia voltar pra dentro do colchão. Nessa hora eu trouxe até uns folhetos pra ele comer e passar um pouco a fome. Entrei no quarto, fui até o leito de K e perguntei, “tu come papel, K?”. Ela respondeu “não”, e virou a cara de volta pro colchão.

Pronto. Naquele momento ela foi ouvida, e seu não foi entendido.

Eu e Caju saímos do quarto. Senti ambiente mudado - isso é tão bom de sentir. K pôde se enfiar sem preocupações no seu colchão.


Contatos cegos são importantes.

Beto.

Sobre os dias ruins

A gente nunca fala sobre os dias ruins, em geral. Apesar do nome do blogguy, aprendyzes, a gente ta sempre falando sobre as coisas que deram certo. Sobre os dias que a gente se emocionou. Sobre o dia em que aquele jogo foi incrível. Sobre o dia em que a gente transformou o ambiente. Sobre o dia em que a criança se abriu pra gente e a gente foi criança de novo e tudo isso fez sentido na nossa cabeça.  Enfim, sempre estamos falando dos dias bons.

Hoje eu quero falar dos dias que não são bons.
Porque tem dias que, simplesmente, não são bons.

Tem dia que a acompanhante não quer te ver;
Tem dia que a criança chora e não importa qual das mil técnicas que sempre funcionam você use pra conseguir se aproximar, ela não te aceita;
Tem dia que o hospital ta vazio;
Tem dia que você não sabe o que fazer;
Tem dia que nenhum jogo encaixa;
Tem dia que o tempo parece passar mais devagar que o costume;
Tem dias que não aparece nenhuma risadinha, nem um sorriso e nenhuma comoção. Tem dia que é de indiferença. Quiça torpor;
Tem dias que você não entende direito qual a sua função ali. Se é que ela existe;
Tem dia que o nariz vermelho pesa um pouco...não é natural.

Pois é, às vezes, as visitas não são boas.E não importa o quanto o palhaço seja forte, ou ache que é forte, tem coisas que não da pra ir contra. O próprio hospital, que reconhecemos, com frequência, como um ambiente duro, quadrado, concreto, muitas vezes é duro demais e é difícil quebrar isso. Algumas vezes, na verdade, é o hospital quem nos quebra. E isso não é terceirizar a culpa. Claro que outros palhaços poderiam se sair melhor, no mesmo ambiente, mas isso não pode diminuir quem sentiu dificuldade.
Desconstruir, no hospital, é trabalhar em um meio difícil. Principalmente quando você está, de algum modo, habituado a ele. Desconstruir o hospital é difícil. Principalmente quando você é ele - e quando, mesmo assim, você ainda se choca e se ofende com tudo o que ele pode ser.

Também tem fatores pessoais. Tem aqueles dias mais difíceis pro próprio palhaço. Tem aquele paciente que lembra alguém por quem você tem mais carinho, tem aquela pessoa que lembra quem você sente falta, tem aquela situação que te irritou ontem, tem o ônibus lotado e quente com aquele pastor irritante gritando a viagem toda...

No fim das contas tem dias que só...não vai. Alguma coisa se perde no caminho e quando você sai da visita e finalmente tira o nariz (e você quase ansiava por isso) você pensa "Hoje não foi...".

É uma sensação difícil essa do "não foi". As pessoas não te dizem que você vai passar por dias "não foi", quando você começa. Na verdade, as pessoas nunca te falam sobre os dias "não foi", em canto algum.

Em dias assim, no entanto, é sempre bom ter um amigo palhaço que olhe pra você, sorria e diga:
"obrigado por ter ido comigo hoje! Foi ótimo!" e te faça pensar naquela acompanhante no fundo da sala que tava sorrindo de olho em vocês, quando vocês nem estavam dando atenção pra ela. Ou ainda te faça pensar na menininha que nem olhou na sua cara e passou o tempo todo de costas, mas que se acalmou um pouco e ficou prestando atenção, quieta, quando vocês começaram a discutir, na porta. Ou ainda que te faça rir pensando em como aquele jogo de vocês dois deu muito errado.

No fim das contas, hoje nem foi um dos dias realmente ruins. Mas hoje, de algum modo, "não foi". Já houveram dias incrivelmente piores, é claro. Mas esse tipo particular de gravidade (contrário à leveza) me sondou hoje, durante boa parte do dia.

De qualquer forma, hoje eu quis escrever sobre os dias difíceis. Sobre o nariz incômodo.

Até pra me lembrar que não somos heróis. Que nem sempre somos bem vindos. E que nem sempre teremos o poder para mudar o mundo, seja ele um hospital, seja ele o mundo particular no qual cada um de nós vive - e que talvez seja o maior de todos.

Mas também escrevi sobre os dias difíceis pra me lembrar de olhar para o pequeno, o simples -o sorriso da acompanhante do fundo da sala, com quem eu nem tava brincando.
Me lembrar de agradecer pelos dias que deram errado. De aprender com eles.
Me lembrar de ir para uma relação aberto, sem grandes expectativas.
Mas, principalmente, pra me lembrar de nunca deixar de ir.



Caju - Mayko

sábado, 18 de abril de 2015

Reflexões sobre nossa hystória

Allan Denizard diz:
ei
Allan Denizard diz:
ei
Allan Denizard diz:
ei
Allan Denizard diz:
ei
KaiLa diz:
uoi
KaiLa diz:
parece tu msm na foto
Allan Denizard diz:
aaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhh
Allan Denizard diz:
a primeira pessoa que concorda com a minha realidade (foto do Volverine)
Allan Denizard diz:
!!!
Allan Denizard diz:
valeu!
KaiLa diz:
hahahaha
Allan Denizard diz:
escrevi um artigo sobre o INVENTÁRIO
Allan Denizard diz:
lê lá
Allan Denizard diz:
http://projetoy.blogspot.com.br/2009/04/os-doutores-da-alegria-estiveram-em.html
KaiLa diz:
sabia q ia dar nisso...
KaiLa diz:
e tu escreveu p eles?
Allan Denizard diz:
não sei se eles vão gostar do que eu escrevi
Allan Denizard diz:
lê lá!
KaiLa diz:
n, n tou falando do artigo ser p eles
KaiLa diz:
e sim uma msg no blog deles esclarecendo as ultimas duvidas..
Allan Denizard diz:
não
Allan Denizard diz:
lê lá!
Allan Denizard diz:
tu tá lendo?
KaiLa diz:
tu te acalma aí, q tou lendo
KaiLa diz:
tá qbrando o clima
KaiLa diz:
aullan
KaiLa diz:
tu mandou isso p eles?
Allan Denizard diz:
não
KaiLa diz:
eu gostei
KaiLa diz:
prncipalmente pelo final
Allan Denizard diz:
mas eu deixei o blog pra eles visitarem
KaiLa diz:
tu acha q n há amor no q eles fzm?
Allan Denizard diz:
não
Allan Denizard diz:
acho que eles não se tocam do amor que há no que eles fazem
Allan Denizard diz:
de que a essência da arte deles é amor
KaiLa diz:
sei não..
KaiLa diz:
assim, o q me pareceu foi mai ou menos aquilo q a gnt discutiu no email do y
KaiLa diz:
e q tu tb falou nesse artigo
Allan Denizard diz:
hum...
KaiLa diz:
pela necessidade de se qrer ser levado a sério
KaiLa diz:
acaba q eles procuram dar mais ênfase na "ciência", no trabalho árduo e tal
KaiLa diz:
do q naquilo q provavelmente os move
Allan Denizard diz:
perfeito Kakys
Allan Denizard diz:
concordo
KaiLa diz:
n acreditam q eles façam esse tipo de trabalho só p ganhar dinheiro p viver
Allan Denizard diz:
e o trabalho deles fica infinitamente menor pensando assim
Allan Denizard diz:
por mais sorrisos de qualidade que eles arranquem
KaiLa diz:
é...
KaiLa diz:
mas tu vê q eles dxam escapar q n é só isso, n eh só técnica
KaiLa diz:
qdo dzm no espetaculo e voltam a repetir na discussão
KaiLa diz:
q n se pode perder a ternura
Allan Denizard diz:
sim sim sim
Allan Denizard diz:
de certa forma
Allan Denizard diz:
ainda não encontraram a identidade deles
KaiLa diz:
acho q na arte, assim cm na medicina, hj é possível se trabalhar só cm p ganhar dinheiro sim e obter sucesso
KaiLa diz:
mas, em certo ramos, da arte e da medicina, n basta só técnica
KaiLa diz:
né n?
KaiLa diz:
 de certa forma
 ainda não encontraram a identidade deles

KaiLa diz:
hahahha
KaiLa diz:
a gnt sim, né
KaiLa diz:
mas parece q é por aí msm
KaiLa diz:
hj eu me sinto bm mais tranquila qto a isso, sabia?
Allan Denizard diz:
acho que nossos achismos são melhores achados
Allan Denizard diz:
você não se sentia?
KaiLa diz:
as 2 coisas podem e devem coexistir sem detrimento da outra
KaiLa diz:
nao..
KaiLa diz:
mas assim..
KaiLa diz:
tvz seja importante passar por varias fases
KaiLa diz:
por exemplo, bm no inciozim do y
Allan Denizard diz:
o Pacheco dizia que deve muito ao estilo tradicional de dar aula.
Allan Denizard diz:
Foi dando mil aulas tradicionais que ele se apercebeu do quanto elas eram inúteis
Allan Denizard diz:
fala
KaiLa diz:
kkkkkkkkkkkkk
KaiLa diz:
pois eh... naqla éopa, foi importante o "amor", digamos assim
KaiLa diz:
foi a paixão q fz com q fizessemos td o q fizemos... de ter coragem de montar m projeto assim, de ficar indo atrás de orientação, de ter perdido horas e horas de folga planejando cm seria, etc e tal
Allan Denizard diz:
foi!
KaiLa diz:
aí veio o macedo dzndo q era melhor ter um preparo mais tecnico, objetivar mais a preparação da equipe, focando mais na formação de um palhaço mais "profissional" q seria principal ferramenta do grupo..
KaiLa diz:
enfim, isso foi super importante tb.
Allan Denizard diz:
foi tb
KaiLa diz:
e aí,a  gnt estudou mais o palhaço do q eu estudei genética
Allan Denizard diz:
hauhauahauhuha
KaiLa diz:
e foi bom. acho demorou mais p gnt chegar na fase de se achar sem graça
KaiLa diz:
e com isso ter um monte de visita acumulada em q a gnt pode ver
KaiLa diz:
q a realidade obviamente n era tão romântica qto tvz a gnt pensasse ser
KaiLa diz:
no início, eu pelo menos tinha uma visão mais romantica, acreditava mais no poder transformador da "palhaçoterapia"
KaiLa diz:
depois agnt vê q é importante, mas tb não ééé coisa de super herói salvando o mundo
KaiLa diz:
aí a gnt passa a qrer fazer trabalho p provar q tm alguma serventia o q a gnt faz
KaiLa diz:
e até onde isso vai
Allan Denizard diz:
mas será se precisa provar?
KaiLa diz:
mas vê... se no incio, a gnt n tivesse essa visao mais romantica, se a gnt n acreditasse q eramos pesoas com y na testa levando amor aos hospitais
Allan Denizard diz:
YYY
KaiLa diz:
será q a gnt teria feito td o q fz?
Allan Denizard diz:
acho que a nossa história provou pra gente mesmo que assim devia ter sido para ser hoje o que somos
KaiLa diz:
poiseh!!
KaiLa diz:
aí a gnt entrou nota fase, de fzr trabalho, fzr ciencia e
KaiLa diz:
e recusar convites
KaiLa diz:
pq a gnt era palhaço de HOSPITAL, coisa profissional, bm estudada e td
KaiLa diz:
n dava p ir ficar alegrando velhim em asilo
KaiLa diz:
criancinha em orfanato
KaiLa diz:
dxa isso pros voluntarios da igreja
Allan Denizard diz:
humrum
KaiLa diz:
aí a gnt se fechou... e passou a focar mais no papel do palhaço no hospital, na terapia...
KaiLa diz:
e daí sairam trabalhos em congressos, publicação em revista
KaiLa diz:
bolsa de extensão...
Allan Denizard diz:
bem-vinda bolsa
KaiLa diz:
a gnt objetivou a coisa. transformou em numeros, dados, resultado
KaiLa diz:
resultados
KaiLa diz:
enfim... importantíssimo tb
KaiLa diz:
a gnt vê pela seleção de novos integrantes
KaiLa diz:
ñ é mais a msm multidão
KaiLa diz:
mas tm mais "qualidade", a maioria dos candidatos sabe onde tá se metendo
KaiLa diz:
n vm mais só o povo atrás de folia. e aqles "mais sérios", mais cientistas tb se interessam
Allan Denizard diz:
foi boa as aspas
KaiLa diz:
poiseh... posso estar errada ou isso só estar se passando pela minha cabeça, mas parece q agora se tenta achar o equilibrio disso no y
Allan Denizard diz:
equilíbrio entre o q e o q?
KaiLa diz:
 "Hay que pegar la veia, perder la ternura jamás!".

KaiLa diz:
hueihiuheiuheie
Allan Denizard diz:
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Allan Denizard diz:
Gostaria de deixar claro que eu estou copiando essa conversa para disponibilizar na nossa lista de discussão

(A conversa continua, mas o Yahoogrupos truncou ela por exceder a capacidade de armazenamento de um e-mail isolado). 

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Sobre o garoto roxo

Eu tinha uma missão simples: colar os cartazes de procura-se do coelho da Páscoa na pediatria do hospital. Resolvi ir de palhaço, mesmo não tendo outro palhaço pra visitar comigo.
Short, meia, tênis novo, maquiagem, cabelo, nariz, maracas. Jaleco por último. Prontíssimo!
Fui. Passei rápido,  sem brincar muito. Ninguém tinha visto o coelho, então fui pra pediatria logo.
Logo no primeiro quarto encontrei um menino todo enrolado, só com a cabeça de fora, assistindo eu pregar o cartaz na porta, sem falar nada, como se nem tivesse ali, de palhaço. Todo mundo esperando que eu fizesse alguma coisa. Fiz menção de sair, depois que terminei de colar o cartaz na porta, ignorando todo mundo. Mas alguém disse "hey". Eu tava esperando por isso. Mas, claro, fingi que não. Voltei. Todos com cara de sim pro jogo.
Conversei com todo mundo e fui pra perto do menino enrolado.
-Oitudobommeunomeécajusoumedicoespecialistaemmarmotistaformadonacuspvimaquisó.... (respirei, sem ar)... Oi
-Oi (sorriso)
-Por que que tu tá todo enrolado?
-...
-ta com frio é?
- (balança a cabeça afirmativamente)
-Pois deixa eu te assoprar! AFUUUUUUU
Passou?
-(Balança a cabeça negativamente. Sorriso)
-Teeeem certeza? Sempre que eu tô com frio eu assopro e melhora. Pera, vou tentar de novo AFUUUUUU...Passou?
-(balança a cabeça afirmativamente. Sorriso.)
-Pois te desenrola macho!
Olhei pra mãe dele que tava do lado desde o começo, e eu ainda não tinha falado com ela. Pensei em fazer ela entrar dentro do jogo, mas ela tava olhando pra mim com uma cara de reprovação bem séria. Achei que ela podia não gostar de palhaço. Pensei em sair. Olhei pro menino. Ele continuava sorrindo e esperando alguma coisa. Daí vi o pé dele. Tava roxo. Bem roxinho. Na verdade eu não sei se era roxo, pois tenho umas coisa estranha nos olhos que num enxergo as cor direito,  mas era uma cor assim... talvez meio roxa. Entendi a cara da mãe. Pensei em parar de brincar mas...
-Sim ma, tu não te descobriu ainda? Pois bora fazer assim, eu me descubro e tu se descobre tá bom?
- tá...
Tirei as maracas do bolso e pedi pra ele segurar. Tirei o Jaleco e coloquei em cima da cadeira.
-Pronto, tua vez
Meio hesitante ele foi tirando o pano. Todo o corpo tava roxo. Ele olhou pra mim esperando eu ter alguma reação. Eu continuei olhando pra cara dele, agora esperando algo dele.
- E agora? Ele perguntou.
-Quer brincar de que?
Olhei pra mãe. A cara de desaprovação tinha virado sorriso tímido. Pediu pra tirar fotos. Pedi pra ela me ajudar com os cartazes.
Iai a visita seguiu. Arrumei um companheiro de pele roxa pra me ajudar a colar os cartazes e que me seguiu a visita toda. Ele não ligava pro meu nariz vermelho, eu não ligava pra pele roxa. Era o nosso trato silencioso. Mais tarde eu até vesti o Jaleco de novo, mas o menino tímido coberto de panos que eu tinha encontrado não precisava mais se cobrir. Inclusive foi todo exibido provar que sabia sim dançar no quarto das meninas.
Voltei pra casa pensando que a gente devia se descobrir mais, as vezes. 
Caju - Mayko