segunda-feira, 26 de junho de 2017

Sobre a menina dos olhos vermelhos

Os olhos vermelhos dela me faziam lembrar de sangue. 
Do sangue que parecia ferver dentro dela e se agitar la dentro, bombeado por um coração gigantesco
 que se empolgava, e se emocionava e que parecia querer sair dali, da contenção daquele tórax, 
para se doar por inteiro e, ao mesmo tempo, recebê-los todos dentro de si. 
E talvez fosse o motivo pelo qual os olhos dela insistiam em se derramar: 
pra poder extravasar toda aquela energia gigantesca que ela tinha dentro de si. 
E que ela não se preocupava em conter. E que ela não se importava em deixar fluir.
E fluia. Intenso. Vivo. Forte. E ainda assim, silencioso, sutil, pacífico.


*Talvez esse texto esteja chegando atrasado, porque eu também cheguei. Mas talvez ele também chegue bem na hora, porque de alguma forma, faz sentido que ele tenha acontecido agora e porquê talvez o universo seja mesmo esperto*

Foram dois dias duros. Cansados. Penosos. Num processo que não só seleciona os outros mas também nos faz nos encontrar com nós mesmos, tentávamos chegar a consensos que talvez não existissem. É difícil debater sobre vidas, sobre experiências, sobre impressões e sobre sentimentos. Mas no meio da confusão gigante que existia dentro de mim e mesmo dentro de nós, como grupo, algumas coisas me saltaram aos olhos e me trouxeram um calor gostoso no peito. Alguns encontros fazem nossa alma sorrir, e esse texto é sobre um desses encontros.

Ela tinha os olhos vermelhos e inchados, porque eles insistiam em se derramar, de forma quase contínua. Ainda assim, ela conseguia ter uma voz tranquila e calma sempre que a voz dela era necessária. E não era só a voz. Era o sorriso que os convidava a chegar mais perto. Era o corpo inclinado pra eles, me dizendo o quanto ela ansiava os abraçar. Cada um deles.

E eu não entendo. Não entendo como. Não entendo o por quê.

Não é só sobre a força tão grande de ser quem ela era, o tempo todo, tão intensamente, por dois dias . Era também sobre ser alguém tão cheio de luz que conseguia enxergar até cantos escuros ou distantes que minha visão não alcançava. Ela viu em todos eles coisas que eu não pude ver. E mesmo nos que eu vi, ela viu além. Ela viu mais. Ela viu mais intenso. Mais bonito. Mais puro. Mais cru.
E ela conseguiu amar a todos. E a todos nós. Mesmo quando nos desencontrávamos. Mesmo quando éramos limitados demais para ver o que ela via. Ao invés de se revoltar conosco - "tolos, como vocês não enxergam?!" - ela sorria e balançava a cabeça, segurando uma mão amiga, seguia em frente.

Ainda lá. Toda lá. Inteiramente lá.  É uma presença até difícil de explicar mas, mesmo sem que ela fizesse nada, meus olhos se voltavam para onde ela estava.

É uma gentileza tão tão mais tão grande que ela conseguia ver em todos eles algo de belo, de único, de especial. Uma gentileza tão grande que ela sofria por não poder dar para todos eles o melhor que eles mereciam. Uma gentileza tão grande que, mesmo em mim, com meu jeito explosivo e turbulento  que eu sempre achei tão diferente dela, ela viu algo de belo e valioso. E, ainda além disso, ela disse que viu a si mesma.
Uma gentileza tão grande que, ainda que sem concordar e, possivelmente sem entender, ela confiou em todos nós e nunca dirigiu sentimento negativo sequer. Ela ainda é abraço e sorriso e olhar aconchegante, mesmo entre seres tão discordantes dela.

Eu não te entendo, menina. Mas eu amo tanto tudo isso que, enquanto leio o que tu escreve, ou agora mesmo enquanto escrevo isso pensando em como me sinto sobre a tua presença tranquila e o teu olhar acolhedor, eu me derramo também Como você se derramou tanto pra tantos deles, candidatos. E pra tantos de nós, seus colegas.

Eu acho que todo esse lance de sair do projeto ta me deixando bastante sensível. Mas eu quero muito te dizer que eu to muito feliz de te ter aqui, enquanto eu saio. De te ver como alguém que ama o Y com tanta intensidade como eu amei (talvez até mais). E eu amo e admiro muito que essa intensidade toda venha com uma gentileza que eu nunca consegui cultivar. E que brilha tanto.

Você é gigantesca.

E é lindo ver que, por trás desses teus silêncios, você é uma mulher tão vibrante e tão intensa.
E eu me senti muito bem de ser encontrado por você. E me sinto muito bem de saber que você nos encontrou.

Espero que o mar calmo e cristalino dentro de ti nunca seque e continue se deixando derramar tantas vezes esse teu coração enorme achar necessário. O som dessas tuas ondas me traz uma paz e uma calma imensos.

E... sabe? Ainda que eu saia do Y e me afaste desse litoral que encontrei em ti; feito concha, eu sinto que há hoje um lugar em mim onde eu sempre vou poder repousar a orelha a fim de me lembrar de como é gostoso ouvir as ondas.

Nenhum comentário: