“Como é difícil ser palhaço”, eu
dizia para todos os meus amigos enquanto estava na minha capacitação. Desde
julho, fui jogada em um mundo novo, no qual o objetivo não era mais alcançar,
e, sim, tentar. A ponte do sucesso, que nós, seres humanos, sempre tentamos
chegar ao final, não era mais para ser atravessada. Nós deveríamos ficar no
meio, nós deveríamos ser a ponte entre dois mundos, ou pelo menos foi isso que entendi depois de tantas incógnitas que foram colocadas na minha cabeça. A
vida que eu conhecia não era mais a mesma. Como assim eu teria que pular corda
de olhos fechados? E se caísse? Como assim teria que dançar com um lenço de
papel? Lenços não dançam! Foi dessa forma que o Y entrou na minha vida,
desconstruindo tudo o que eu havia construído.
Depois de muita preparação,
chegou a tão temida “Primeira Visita”. Em meio a vários Colegas-Y, todos
imersos em uma aura de expectativa e ansiedade , coloquei minha roupinha
listrada de branco e vermelho, meu sapato colorido, meu laço enorme na cabeça
e, por fim, o nariz rubro (colocado num mar de pancake e tinta). “Voilà”! Tinha
me transformado na Doutora Amêndoa. Pelo menos no exterior, porque no interior
eu continuava a Amanda que tinha medo de errar, que tinha medo de não ser
engraçada o suficiente e que temia não cumprir sua missão, que era ser ponte.
A visita começou meio capenga,
comigo quase em desespero, buscando loucamente a ajuda de meus colegas. “Oi,
tudo bom com você?”, era o que eu falava para tentar quebrar o gelo, mas nem
sempre era o suficiente. Eu via o ambiente mudar, mas porque estava sempre com
meus colegas que faziam seu trabalho mais do que satisfatoriamente. Sentia o
peso nas minhas costas, a expectativa das pessoas para que eu falasse algo
divertido e que fosse levar algum conforto ali naquele meio hospitalar tão
cinza. Eu queria fugir, queria tirar a maquiagem e voltar a ser eu mesma, comum
e imperceptível. Depois de algum tempo, porém, o jogo começou a virar.
Uma mãe me chamou, junto com a
Doutora Crystalina, para animar sua filha. “Por que você está triste?”, nós
perguntamos, e ela, com pesar nos olhos, nos respondeu “não posso andar”. Por
um segundo, eu congelei. O que eu poderia dizer que fosse consolar essa menina?
Aí que Crystalina entrou, e, logo depois, eu entrei junto, jogando conforme o
que era necessário naquela situação. Um sorriso começou a ser formar no rosto
da nossa “paciente” e começamos a ver a sua mudança de humor. Tínhamos conseguido!
Fizemos a diferença naquele dia, e, se tivesse ido embora ali, já estaria
satisfeita.
O melhor de tudo é que permaneci. A partir daí, só vieram flores.
Subimos para ver mais crianças, e elas, como se soubessem do meu aperreio,
estavam bastante animadas somente com a presença de palhaços ali. Não era
preciso que eu fizesse muito para poder fazer parte do mundo delas. Brinquei de
pega-pega nos corredores do hospital com Vitor, batizei o Pou da Cássia, me
surpreendi com o forte aperto de mão do Wesley. Além disso, fiz concurso de
dança e assisti a uma menina jantar enquanto conversava com ela. No fim, como
se fosse a cereja do bolo, uma das crianças chega até mim e diz “vocês vão
voltar, não é?”. Com essa pergunta, não importava mais se o começo da visita
não tinha ido como o planejado, eu tinha cumprido minha missão ali.
Naquele dia, entendi que o
palhaço é muito mais do que eu imaginava. Entendi que meu jeito pragmático de
ser talvez me atrapalhe a alcançar o significado do que realmente é estar ali
de nariz vermelho, mas que, com certeza, não deixarei de tentar ser a ponte
entre a angústia e o sorriso.
“Como é difícil ser palhaço”, eu
afirmo agora depois de ter vivido na pele.
Ruiva
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