Ser polvo, ter poros, agir em
sinceridade.
Mas,
tudo isso? Atenção no espaço, no outro com quem jogo, nos outros da plateia com
quem posso também jogar, em mim, no jogo, no tempo, nos objetos, no Toinho
passando atrás de mim, no “feeling”... Mas, TUDO isso??
E
ainda há aqueles que perguntam se não temos nada o que fazer. Meu amigo, se
você também se dispusesse a vestir essa menor máscara do mundo comigo,
acredite, você não estaria se esforçando em fazer o nada, mas sim fazendo tudo.
E
é difícil. Sim, é muito difícil. Cansa, amassa a gente, empurra-nos pra nós
mesmos como se estivéssemos dentro de uma bolha que encolhe cada vez mais. Às
vezes aperta de um jeito forte, asfixiante, que chega a não caber partes da
gente em nós mesmos. Então a gente cospe, a gente deixa escapar certas coisas.
A questão é que esse deixar escapar também pode doer, e é também difícil.
É
por isso que sempre ouvi, e vou sempre dizer. Palhaço é também destruição.
Calma, calma, calma. É destruir-se de forma respeitosa, no seu tempo. Você toma
as rédeas dessa destruição, se assim permitir destruir-se respeitosamente, e
assim, romper a barreira da bolha que encolhe. Após isso, brincar com aquilo
mesmo que tanto me encolhia, reprimia, e até sentir saudade depois de dar um
adeus. De novo, não é fácil.
Mas
para que haja essa destruição, é preciso ter algo antes construído... sim? Sim,
e já há. Vocês, cada um de vocês, Preta, Rafa, Sarah, Vermelha, Ju, Azul, Jucá,
Cantal, Lara, Laís, Miná, Af, Mayko, Sebbe, Vanildo, Renan, já têm algo muito
bonito em vocês. Nós temos a coragem. A coragem grande de assumir que temos
medos. Que sentimos desconforto, que sentimos dúvidas sufocantes, assumimos,
enfim, que sentimos.
E
é nesse movimento de sinceridade que se inicia uma aproximação consigo. Ser
polvo é ter muitas mãos para alcançar tudo no espaço, eu, o outro, o som de
catarro escarrado no banheiro, o homem da portaria passando 1m por trás de mim.
Tudo isso, ao mesmo tempo agora.
E
conseguir assim ser polvo, é estar vazio, com vazios a serem sempre preenchidos,
poros que dizem sim ao jogo do outro, que não desistem do jogo, que fazem com
que sejamos, nós mesmos, na frente de muitos, ou mesmo de um público formado
por uma só criança – o que já é muito para o palhaço, é sinônimo de casa cheia
para o espetáculo.
Sendo
nós mesmos, agimos na sinceridade, sentimentos sinceramente, mostramos com
sinceridade. E não é fácil sermos sincero com um público. Mas o início de tudo
isso é sermos sinceros com nós mesmos. Palhaço não é só destruição. Ser palhaço
é ter coragem, é se conectar ao espaço e aos outros. Ser palhaço é perceber os
detalhes, sentir de forma atenta, intensa. Mas palhaço é, especialmente,
aceitação.
Aceitem
a angústia que sentem, o medo, a vergonha. Sintam.
E
sim, vocês nasceram para isso.
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