Estamos ao segundo dia da ofycyna. Estou mais bruto, mais branco. Estou com cabelos mais brancos, com mais bucho. Não estou sozinho.
Bonito ver que a corda gira, o tempo passa, e a solidão não aumenta. As horas despendidas girando o mundo nos converteram em maior amante da esperança de que há como alegrar-se fora dela. Fora de quem? Dela, da esperança. Da espera de que tudo mude. Vou me alegrando com o próprio girar do mundo.
- Que vão! Que tolo!
Em breve meu filho terá 50 anos, selará meus olhos com um beijo, espetará a barba numa pele fria. Será minha vez de ser conduzido num giro, atravessando o umbral de um pórtico em que antes, logo antes, estava escrito "nunca mais", "no more...". Antes de entrar lá, um vento lambe o rosto, uma mosca de fruta sobrevoa os olhos.
- Onde estão todos, meu Deus!
É Deus quem responde:
- Estamos aqui!
Encaro o outro lado, que sempre se agitou na frente destes olhos de carne, ainda que cegos, e o que vejo? Velas amorosas a me ferir os olhos, e todos que até bem pouco eram meu apoio, minha mancha, minha marca, meu porto seguro, a me acolher de novo e com palmas e com um artesanal bolo de limão, cuja calda escorre feito o véu da vida, devassada pelos mil dedos dos gulosos.
Sabe como estamos apreendendo as coisas? Com os nervos e as entranhas. O corpo dói, a queimadura não fecha, e essa brecha emenda com a abertura que nos transpassa e provoca vômito. Uma garota havia definido bem, em outra geração: vomito de arco-irís. Difícil definir o encontro das cores, esmaecem-se até se fundir no todo.
Roda o arco-íris feito toposférica corda. As estrelas contornam os corpos, deixam-nos pontilhados. Leveza. Quero ajudá-los a passar pela corda. Maldita mosca! Sua existência é dizer em meu ouvido:
- Deixe-nozzzzzz zzzzzzentir a corda...
Fico me perguntando até onde a inutilidade essencial dessa mosca vai me levar, já que me trouxe de tanto lugar. Lá!
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