Se tivermos na mente a concepção evolucionista simplória herdada de certo círculo gnóstico medieval que pregava ser a história um contínuo ascendente linear, assim como a vida humana, e também cada aprendizado menor da vida humana, estaremos em maus lençóis. E, a capacitação inicial que damos aos novos ypsilonianos é uma violência.
Preparo-me para ser chacota dos mestres do teatro e do clown ao dizer o que vou dizer. Em mais ou menos quarenta horas iniciamos os meninos e meninas na teoria do jogo teatral, na assunção do personagem em cena, no exercício da contra-cenação, no desafio da improvisação, na apresentação da máscara, em sua grandeza mística, em sua corrupção profana, no seu apequenamento artístico para o cômico, nas noções de sublime e grotesco, na maquiagem e na figurinização de si para revelar-se palhaço. Quarenta horas.
- 40.
Desculpem-me, senhores. Sei que isso leva uma vida. Há famílias de palhaço tradicionais que vão favorecendo o desabrochar do descendente de palhaço desde o berço. Vendo como ele se move, como se levanta, como cai, como corre, etc. Fora das tradições, secularizados, encontramos artistas que se esmeram na aquisição das virtudes do ator em palco, interpretando textos, das escolas mais diversas, para só então se jogar ao improviso, e daí ao palhaço. Leva-se em torno de cinco anos.
- 40, horas.
Então, eis minha primeira explicação. Não acredito em evolução linear. De dramas a história é feita. Guerras e Paz e Guerras. Há quem reconheça o ridículo e a fragilidade humana para superar qualquer conflito histórico e acrescenta os deuses para permitir os finais. Outros contam a história a partir de homens e mulheres heróicos, e nos tornam deuses. Não sem sangue, não sem dor, não sem morte. Aqui e acolá, uma pitada de ressurreição. O amor, e toda a incongruência dele, contudo, sempre está presente. E ao contrário de ser um alívio, muitas vezes torna-se mais um capítulo da angústia. Se aparece trazendo felicidade, como não encarar o seu espelho mais sombrio: a perda do ser amado, pela morte ou pela traição?
A história é, quando muito, uma espiral. Se é que aprendemos alguma coisa e crescemos, e acredito que sim, aprendemos e crescemos, como crescem os concertos, isto se dá eivado de conflitos. Mas, sempre se dá a partir de um início. Debatemo-nos entre a sombra e a luz. No choque dos contrários, forjada é a nossa personalidade. Metal, fogo, água e martelo.
A capacitação inicial do Y é o início, um começo complexo, confuso, intenso. Há quem termine feliz, e há quem queira chorar. Ninguém termina o mesmo. Onde terminará? Só vi duas saídas nestes onze anos de projeto: a desistência e a paciência. Viver o nascimento de si para a arte em meio a um universo de ciência é, no mínimo, problemático. Perturbador é viver o nascimento de si para a arte em meio a outros oito nascimentos.
Mas, é isso, criança: nascimento. Peço paciência. Nada do que um dia após o outro. Peço, então, trezentos e sessenta e cinco, e nos encontrarmos ao final. A pelugem terá caído, sua miopia diminuído, as pernas estarão menos trôpegas. Quando voltar para a corda, e atravessar só mais uma vez, olharei em seus olhos e perguntarei: e então?
Resposta: (... volte daqui há um ano...)
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